Autor Daniel Schenker
Precisão e cálculo no percurso da Armazém

A estrada de ferro, principal elemento da cenografia de Paulo de Moraes e Carla Berri, atravessa a pequena cidade que ambienta Inveja dos Anjos. Mas há uma bifurcação na estrada, que parece seguir por um atalho, terminando logo após. Os personagens do novo espetáculo da Armazém Companhia de Teatro “acumulam” estes dois direcionamentos. Por um lado, têm algo de fim de linha, no sentido de portadores de vidas irrealizadas, distantes da concretização de seus sonhos, encasteladas, em alguma medida, em lembranças luminosas. Por outro, são afetados por surpresas capazes de apontar para uma imprevista continuidade.
Um Hamlet em sintonia com o teatro de hoje

Hamlet, a mais célebre tragédia de William Shakespeare, é um veículo privilegiado para o diretor Aderbal Freire-Filho lançar questões bastante pertinentes em relação ao teatro contemporâneo. Esta perspectiva desponta, sobretudo, na passagem em que o personagem-título faz uma série de indicações aos atores de sua peça.
Transições demarcadas estruturam atuação

Extraído de Os Irmãos Karamázov, de Dostoiévski, O Grande Inquisidor, na versão do diretor Peter Brook, evidencia uma concepção de teatro calcada na presença do ator como elemento primordial. Esta característica vem norteando os espetáculos de Brook (a exemplo do recente Fragments), que, em décadas passadas, percorreu aldeias africanas com seus atores. Uma experiência comprovadora de que o teatro é uma manifestação artística fundada nas presenças do ator e do espectador, sendo que ambos não precisam necessariamente falar a mesma língua. Esta perspectiva remete ao Teatro Pobre, de Jerzy Grotowski, que, por meio de tal expressão, não se referia a uma eventual importância da escassez de recursos, mas sim a uma essencialidade do teatro, localizada no ator.
Engrenagens expostas diante do espectador

A concepção cenográfica de Cine-Teatro Limite, assinada por Rui Cortez, talvez traga à tona uma das principais características desse novo trabalho de Pedro Brício: a opção em deixar expostos mecanismos de construção cênica. Composto por uma espécie de painel de fundo (de tom verde-acinzentado e de textura gasta) que escorre pelo chão delimitando um espaço de representação, o cenário, porém, conta também com elementos localizados nas laterais do palco – fora, portanto, desta geografia circunscrita – que são deixados propositadamente à vista do espectador. De um lado, uma cama e um armário; do outro, parte da coxia, como que “lembrando” o público de sua permanência no teatro.
Sugestões esboçadas
O recém-encerrado Festlip proporcionou ao espectador um breve contato com representantes da produção teatral de países de língua portuguesa. Há um mérito incontestável nesta proposta, ainda que o resultado apresentado nem sempre se revele satisfatório.
De Cabo Verde desembarcou O doido e a morte, montagem do Grupo Teatral do Centro Cultural Português do Mindelo, que, fundado em 1993, ocasionalmente se dedica à encenação de textos da dramaturgia clássica. No caso específico deste espetáculo, os integrantes decidiram se deter sobre uma obra do autor português Raul Brandão, centrado da perspectiva do fim iminente ao confrontar um político poderoso com a súbita presença de um terrorista.