Autor Daniel Schenker
Debate teatral a partir de Tchekhov
Anton Tchekhov lançou discussões artísticas – presentes em suas grandes peças, escritas na primeira década do século XX – que permanecem atuais. Talvez a mais evidente possa ser encontrada em A gaivota através do contraponto entre Arkádina e Treplev, mãe e filho que travam uma relação absolutamente passional, ambos defendendo visões de teatro contrastantes – ela uma atriz-diva, símbolo de uma cena atada a convenções, e ele, promissor aspirante a dramaturgo, escrevendo em busca de “novas formas”, norteado pela inquietude. Em Tio Vanya, o acalorado debate artístico também desponta, mesmo que de modo um pouco mais discreto, sinalizando uma das fontes de frustração do personagem-título. Atormentado pelo descompasso entre o que gostaria de ter sido e o que efetivamente se tornou, ele já começa a peça revoltado com o fato de ter passado anos devotado à figura do professor Sérébriakov.
O avesso das convenções teatrais
In on it, peça de Daniel MacIvor, desponta como um exercício intrigante. O termo exercício não diz respeito a um material apenas rascunhado, que não teria atingido um acabamento profissional, e sim a uma dramaturgia em aberto, “indefinida”, propícia à experimentação, principalmente no modo como diretor e atores lidam com a alternância de planos entrelaçados pelo autor.
Ao longo de toda a encenação, Enrique Diaz deixa a impressão de subverter convenções teatrais. Os atores Emílio de Mello e Fernando Eiras transitam, por exemplo, entre registros vocais diversos: no plano em que os personagens surgem “desarmados”, conversando de modo coloquial, suas vozes entram em sintonia com um naturalismo construído, destituído de efeitos; já no plano em que os personagens representam, os atores se valem de uma projeção mais tradicional, mais frequentemente encontrada em apresentações teatrais.
Peças que desafiam o espectador
O Festival de Curitiba recebeu boa parte das Autopeças da Companhia dos Atores, projeto concebido com o intuito de comemorar os 20 anos do grupo. No Teatro Paiol o público assistiu a Esta propriedade está condenada, com direção e atuação de Suzana Ribeiro, Apropriação@, conduzida por Bel Garcia, Bate Man, com Marcelo Olinto, e Talvez, assinado por César Augusto. Ficaram de fora do festival Os vermes, montagem de Marcelo Valle que reunia um maior número de atores, e A ordem do mundo, monólogo com Drica Moraes.
A transição para a modernidade
A mulher e o teatro brasileiro do século XX, livro organizado por Ana Lúcia Vieira de Andrade e Ana Maria de B. Carvalho Edelweiss, não se limita a uma reunião de artigos sobre algumas das mais importantes atrizes, diretoras, dramaturgas e críticas que vêm marcando com assinatura forte a história do teatro no Brasil.
Nos textos referentes às atrizes houve a preocupação em destacar como cada uma direcionou a sua carreira a partir da transformação do teatro no país, que, pouco a pouco, deixou de priorizar espetáculos conduzidos pela personalidade carismática de um intérprete para valorizar um processo mais refinado de construção de personagens, propostas de direção mais autorais e uma dramaturgia mais consistente.
Espetáculo determinado pela cenografia
A montagem de Dois irmãos investe em algumas tendências bastante frequentes em investigações cênicas recentes, principalmente as realizadas por grupos jovens e/ou por companhias movidas por inquietação artística. A mais evidente diz respeito à busca por uma espacialidade diferenciada do formato tradicional, tanto no que se refere à movimentação dos atores quanto à inserção do espectador; a mais interessante reside no comprometimento dos atores com o instante imediato da cena.