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Virá?
Vol. VIII n° 66 dezembro de 2015 :: Baixar edição completa em pdf
Resumo: O texto pretende analisar o espetáculo Projeto brasil, peça da companhia brasileira de teatro, de Curitiba, sob a perspectiva da relação com o espectador, a partir dos conceitos de interpelação e apreensão dos atos de fala de J. L. Austin, das ideias de Althusser e Judith Butler. O texto também aborda a obra como uma síntese e um ponto culminante do trabalho autoral do grupo.
Palavras-chave: interpelação, endereçamento, atos de fala, apreensão, dramaturgia contemporânea
Abstract: The text aims to analyze Projeto brasil, a play by companhia brasileira de teatro, a theatre group from Curitiba, Brazil, studying the relationship the plays proposes to the spectator regarding the concepts of interpellation and uptake in J. L. Austin’s speech acts as well as in the ideas of Althusser and Judith Butler. The article also approaches the work as a synthesis and a high point in the authorial trajectory of the group.
Keywords: interpellation, addressing, speech acts, uptake, contemporary dramaturgy
“Se eu pergunto e vocês me respondem,
alguém me responde,
podemos começar o diálogo.”
Vida, companhia brasileira de teatro
Em 2013, em Belo Horizonte, participando do Festival Cenas Curtas do Galpão Cine Horto, assisti a uma cena da companhia brasileira de teatro, com duração de quinze minutos, intitulada Taubira, criada para o festival como demonstração de processo de criação ou como uma experimentação a partir de uma pesquisa do grupo. A cada um dos três dias de festival, depois das apresentações dos grupos locais, assistíamos a uma cena de uma companhia convidada. O grupo Clowns de Shakespeare já tinha apresentado uma bela homenagem ao teatro, cheia de referências à trajetória do Grupo Galpão. A cena da brasileira ficou para o último dia e acabou acontecendo como uma celebração dos encontros do festival.
Amarildo e Taubira
Este artigo foi produzido para uma participação na mesa-redonda intitulada Tendências dramatúrgicas contemporâneas, que integrou a programação do I Seminário Latino-americano de Teatro organizado pelo Instituto Boal na Faculdade de Letras da UFRJ, em outubro de 2013.
Tendo em vista a proposição da mesa-redonda, apresentada no título Tendências dramatúrgicas contemporâneas, procuro estabelecer num primeiro momento um breve horizonte de significados para cada um dos três conceitos aqui envolvidos – tendência, dramaturgia e contemporaneidade – para, assim, colocar em palavras alguns questionamentos que têm me acompanhado recentemente a respeito do teatro e dos seus lugares possíveis no mundo.
A arte é o nosso negócio
“Há um sério risco de acabarmos por encontrar um emprego para a nossa ociosidade”
A insurreição que vem – Comitê invisível
Cada um dos quatro atos da peça Ópera dos vivos, encenada pela Companhia do Latão, de São Paulo, com direção de Sérgio de Carvalho, reconstitui uma etapa histórica da instituição de regimes de dominação da metade final do séc. XX. Os problemas que podem ser colhidos dos argumentos da peça, com os quais a sociedade atual está se deparando, referem-se a um novo regime de dominação dispersa, que Gilles Deleuze identificara como um regime de controle contínuo, percebido na substituição do cárcere por coleiras eletrônicas, na avaliação continuada e na formação permanente das escolas, nos hospitais, nas empresas e nas formas de tratar o dinheiro. A questão que paira para Deleuze e que se encaixa como questão da Ópera dos vivos é: ao que estamos sendo levados a servir?
Ato de variação
Na tentativa de repensar o indivíduo e a sua relação com o mundo, a Companhia Brasileira de Teatro montou a peça Oxigênio, que está em cartaz no espaço SESC até o dia 29 de maio. Numa melhor definição, poderíamos dizer que há na peça uma preocupação com o essencial e o institucional. Ao perseguirem o que de fato pode auxiliar o indivíduo na descoberta da sua presença no mundo, há o perigo de se instituir os caminhos e engessá-los sem levar em consideração o particular, o dinâmico. Nessa condição paradoxal, as questões sobre o que determina nosso lugar no mundo são feitas pelo dramaturgo russo Ivan Viripaev. A forma encontrada pelo diretor Marcio Abreu para afastar sua montagem de um teatro de instituições foi mesclar uma série de linguagens: a música, no ritmo marcado e preciso da peça; a moda, no vai e vem dos atores pelo palco-passarela, desfilando suas idéias; o talkshow, com microfone aberto para discussões entre os atores; a ficção, com a história da Sacha e do Sacha; a biografia, através do dialogo franco entre Patrícia Kamis e Rodrigo Bolzan, atores da peça. Com isso, ele consegue devolver o poder de impacto de certas palavras, e consequentemente de certos atos, que foram perdidos devido a um processo de dessensibilização social. Assim, o conflito que é proposto em cena escapa dos conflitos previstos por um sistema institucional e não pode ser controlado por ele. Essa é a inquietação que a peça causa no espectador, a ele é oferecida uma brecha para se repensar.
Uma reavaliação das posturas individuais
Uma interrogação essencial a atravessar as estruturas da peça Oxigênio, da Companhia Brasileira, é de que modo o ator pode se colocar legitimamente no palco, diante do autor das palavras que profere, do colega com quem contracena e, em última instância, do público.
O texto do dramaturgo russo Ivan Viripaev exige esse autoquestionamento, na medida em que derruba as roupagens com que um ator costuma se travestir ao assumir um papel. Faz com que os personagens catalisadores do espetáculo, um assassino passional e sua musa cúmplice, se esfacelem, sobrevivendo apenas como artifícios para proveito dos narradores. Estes, à sua vez, também se desmantelarão.