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Nos desdobramentos do Teatro Pós-Dramático: Beckett através de Artaud e Deleuze

27 de maio de 2015 Traduções e

Vol. VIII nº64, maio de 2015

“Eu preferiria que o texto não fosse visto em nenhum formato antes de ir para a cena e não aparecesse em forma de livro até que eu tenha assistido a alguns ensaios em Londres. O texto não pode ser definitivo sem um trabalho real dentro do teatro.” Samuel Beckett sobre o texto de Happy Days [Dias Felizes], 1961.

Através de Artaud

Na entrada para o espaço menor, no andar de baixo do Théâtre du Rond-Point (saindo da Avenida Franklin D. Roosevelt, no oitavo arrondissement em Paris, não muito longe dos Champs Elyssées), há duas fotografias imponentes perduradas, de dimensões amplas, uma de Antonin Artaud, a outra de Samuel Beckett. A partir de 1958, esse teatro passou a ser dirigido por Jean-Louis Barrault (1910-1994), que fora, no entanto, demitido do cargo pelo ministro da cultura gaullista André Malraux durante a revolta estudantil na primavera de 1968. O Théâtre du Rond-Point, sob a direção de Barrault, foi um dos teatros de Paris onde a Compagnie Renault-Barrault introduziu aos parisienses o que era então entendida como performance avant-garde europeia, incluindo as peças de Samuel Beckett.

A interdisciplinaridade e a crítica

26 de dezembro de 2011 Estudos

Este texto surge da fala que proferi durante o 1o Encontro Questão de Crítica, realizado em novembro de 2011, no Galpão Gamboa.

Um contexto: o que forma uma categoria?

Começo o texto pelo contexto. E o contexto que escolho para pensar a interdisciplinaridade e a crítica vem de duas palavras que me orbitam o pensamento: disciplina e categoria. Entendo disciplina como um treino ordenador. Entendimento empírico que surge dos procedimentos que experimento na sala de ensaio. Quando estamos na sala construímos fluxos – pré-acordados ou não – que quanto mais se repetem mais ordenam a forma com que o treinamento corporal se dá. 1. Como fluxo, disciplina é uma noção de movimento. 2. Como repetição, disciplina é o que há de comum nesses movimentos e esse comum nos ordena. 3. Como fluxo repetitivo, esses movimentos trazem entre si não só o que há de comum, mas também diferenças que lhe escapam, pois em toda repetição, há sempre a diferença que escapa. Essa diferença é potencialmente a subversão do comum, e é o que faz da disciplina passível de mudança, seja pela sua exaustão (não tenho mais porque seguir fazendo o que faço) ou por seu desenvolvimento (depois de tanto fazer igual decidi ou comecei a fazer diferente). De toda forma, penso, disciplina é movimento.

Janela barroca

14 de novembro de 2010 Críticas
Foto: divulgação.

“O presente está grávido do futuro; o futuro poderia
ser lido no passado; o distante é expresso pelo próximo.”
(Leibniz, Principes de la Nature e la Grace fondés en raison)

O espaço cênico do Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto, por ocasião da peça 201, argumento e direção de Dulce Penna de Miranda, foi dividido em duas metades por uma parede, criando duas ambientações diferentes para um mesmo apartamento em épocas diferentes. A parede e sua ampla janela, que permite a visibilidade simultânea de ambos os espaços, é o fundamento para uma reflexão sobre a singular potência que há no cotidiano. Cada lado-época está relacionado, sob um regime de atualidade/virtualidade, com o outro. Separados pela janela, um é o lado de fora do outro, estruturando uma univocidade narrativa na qual os locatários de cada lado-época se complementam e constituem uma cadeia causal não linear que se reflete em todos os sentidos do tempo. A exemplo dos mundos compossíveis de Leibniz, o apartamento 201 é construído sob a égide de uma força barroca que dobra o tempo sobre si e redobra o espaço para a construção de uma cena livre da ordem cronológica dos acontecimentos retilíneos. Os mundos possíveis são conjuntos lógicos de conceitos individuais; com o advento da perspectiva, cada percepção formula seu mundo particular. Os mundos compossíveis são todos os desdobramentos que cada acontecimento pode sofrer e a percepção é a janela entre esses mundos, sendo o melhor dos mundos possíveis o que se chama de real.

A noção de corpo-sem-órgãos em Artaud e no Teatro da Crueldade

19 de março de 2010 Estudos

1) Um homem que inquietou os homens

Antonin Artaud empenhou sua vida para expressar uma visão acerca da “verdadeira e imortal liberdade”. Dedicou seu corpo a um fazer teatral que anunciava a amplitude de se viver livre – um teatro ritual que extraía o indivíduo dos liames que o ancorava, que chocava e proporcionava um desejo de viver. Parece-me que ele mesmo fugia do juízo como se estivesse atolado em um pântano de piche. Completamente imerso nessa armadilha viscosa, Artaud elaborou um plano de purificação para gerar um novo corpo que não era nem humano nem metafísico, e ainda, refratário e autônomo, um corpo de resistência e intensidades: o corpo sem órgãos.

A sobrevivência do tempo

26 de fevereiro de 2010 Críticas

Atrizes: Rosanne Mulholland e Simone Spoladore. Foto: Hannah Jatobá

Questões formais

Na peça Louise Valentina, o diretor Felipe Vidal usa recursos cinematográficos que sugerem uma percepção diferenciada do espaço cênico. Ele acrescenta uma profundidade de campo ao palco ao projetar quatro sequências de curtas-metragem dirigidos por Marcela Lordy. A profundidade de campo foi uma técnica inovadora de filmagem que surgiu no cinema da década de 40; ela permite que o espectador de cinema veja um só plano que põe em relação o plano de fundo com o primeiro plano, passando por todos os três tipos de plano: geral, médio e close. Este procedimento foi desenvolvido por Orson Welles que, ao por a câmera em um ângulo diagonal preciso, conseguia atravessar todos esses níveis e mantê-los em foco. Foi bem explorado por ele no filme Cidadão Kane para acrescentar diferentes níveis de situação e de tempo em uma única imagem.

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Questão de Crítica

A Questão de Crítica – Revista eletrônica de críticas e estudos teatrais – foi lançada no Rio de Janeiro em março de 2008 como um espaço de reflexão sobre as artes cênicas que tem por objetivo colocar em prática o exercício da crítica. Atualmente com quatro edições por ano, a Questão de Crítica se apresenta como um mecanismo de fomento à discussão teórica sobre teatro e como um lugar de intercâmbio entre artistas e espectadores, proporcionando uma convivência de ideias num espaço de livre acesso.

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