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Acúmulo de solidão em cena
Em Adágio, a solidão desponta como tema no texto de Gustavo Bicalho e Mauro Siqueira e como proposta de atuação, lançada a Suzana Castelo e, em especial, a Márcio Nascimento. Ao estabelecer “contracena” com um boneco em escala humana, o ator é levado a acumular uma dupla função: encarrega-se das motivações de seu personagem e manipula o outro da cena – no caso, o boneco –, responsabilizando-se por suas reações. É uma circunstância distinta da habitual, em que os atores são estimulados pelo contato com os parceiros de cena. Em mais um momento da montagem assinada por Gustavo Bicalho e Henrique Gonçalves, os atores contracenam por via indireta. A atriz interage com o boneco – por sua vez, manipulado pelo ator, cujo personagem não está em cena nesse instante. Diferentemente da primeira passagem mencionada, nessa os dois intérpretes se encontram envolvidos na construção da situação, mas o fato de não firmarem uma relação direta também remete a um solitário estar em cena.
A luz no lugar escuro
O espetáculo teatral O lugar escuro, dirigido por André Paes Leme e escrito por Heloisa Seixas, pretende lançar luz sobre um tema que vem ocupando a população mundial recentemente: o mal de Alzheimer. Com a ampliação da expectativa de vida dos idosos nos grandes centros, surge a demanda de se refletir acerca dos problemas pertencentes a esta fatia da sociedade.
O fato de a doença atingir em grande parte idosos, agindo sob o cérebro dos mesmos, apagando suas memórias e causando um quadro de demência, faz-nos observar uma representação da loucura distinta da esquizofrenia e de outras doenças neuropsicológicas que tocam pessoas mais moças, que, por vezes, já apresentam seus sintomas de insanidade desde o momento do nascimento.
Opções diante do relato pessoal
O lugar escuro nasceu como a canalização artística de experiências pessoais de Heloisa Seixas – primeiro transpostas para a literatura e agora adaptadas para a cena –, particularmente no que se refere à convivência dentro da esfera familiar com o Mal de Alzheimer. A autora propõe uma estrutura norteada pela reverberação da doença da mãe nas vidas de filha (personagem que simboliza a própria Heloisa) e, com mais suavidade, neta.
A burguesia é branca
Está em cartaz, até o dia 27 de julho, no Espaço SESC em Copacabana, o espetáculo As regras da arte de bem viver na sociedade moderna, escrito pelo francês Jean-Luc Lagarce, com atuação de Lorena da Silva e encenação de Miguel Vellinho. Apresentado no Espaço Bar, área cênica reservada para experimentações de caráter mais intimista (o espetáculo comporta somente trinta e dois espectadores), a linguagem da encenação produz reflexão que, por meio da ironia, retrata o jogo de interesse que esclarece a essência da filosofia de vida na sociedade capitalista-burguesa, onde as relações de privilégios e regalias entre as elites estruturam-se solidamente em laços perpétuos de comunhão “fraternal” ou “amorosa” nos sacramentos da Igreja Católica.
Entre atores
A montagem de Realidade virtual tem no elenco Claudio Mendes e Marianna Mac Niven, que optaram por dirigir a si mesmos, tendo Josué Soares como diretor de corpo, gesto e movimento. O texto do norte-americano Alan Arkin, traduzido pela própria Marianna, parece bastante despretensioso. Trata-se, certamente, de um texto cômico, mas tanto a dramaturgia como o tratamento dado a ela pela encenação se desviam dos caminhos mais comuns da comédia – digo isso levando em consideração o que é mais visível como comédia no teatro carioca, ou seja, o que mais se vê nos espetáculos que são grandes sucessos de público, como os que fazem apresentações em casas de show ou têm chamadas na televisão. Realidade virtual não tem bordões nem estereótipos, muito menos piadas. Há diversos momentos engraçados, mas não há aquelas pausas para a platéia rir que transformam as peças cômicas em algo parecido com um show de calouros. Não se trata de algo feito exclusivamente para fazer graça; o riso não é obrigatório. No entanto, mesmo dentro dessa perspectiva de comédia, há um pequeno desequilíbrio entre as atuações.