Tag: leonardo netto
Três palavras, três maneiras
Garotos
Uma das minhas primeiras experiências de ataque homofóbico foi na rua, sozinho, pego de surpresa. O tapa foi na base da cabeça, um pouco acima da nuca. Logo em seguida, um soco no ombro direito. E um empurrão que me fez dar um passo forçado adiante, para não cair no chão. O ataque físico não foi grave, ficou só o tal do “susto” – sensação que está na minha cabeça até hoje. Coração aos pulos, eu tentava simular algum tipo de valentia, enquanto analisava em poucos segundos se deveria correr ou não. Os três garotos passaram por mim e foram embora, rindo, enquanto olhavam para trás.
Independente da gravidade, acho que qualquer experiência desse tipo mostra como o mundo pode ser perigoso para a população LGBTQI. Mas não só isso: o perigo existe e é acompanhado de crueldade. Trata-se não só do desejo de eliminação do diferente, mas de fazê-lo com sadismo e, de preferência, na frente de outros. Não só o exercício da força, mas o exibicionismo público dela.
A crítica, o artista e o intocável
Uma história que fala do medo da exposição e o seu limite. O bom canário, texto do norte-americano Zacharias Helm, que esteve em cartaz no Teatro Poeira até o dia 4 de março, expõe a vida do casal Annie e Jack no momento em que os dois tentam lidar com um sucesso literário e um vício em anfetaminas.
Com direção de Rafaela Amado e Leonardo Netto, a peça começa com uma espécie de prólogo, no qual os atores caminham em torno de Flávia Zillo (Annie) que, parada no centro do palco, nem parece escutar as falas de seus companheiros de cena que ditam as características do que seria uma pessoa de personalidade fraca e vulnerável. Insistem em sublinhar a ideia de que “não é o mundo que é pesado demais”, mas sim algumas pessoas que não têm força para viver nele. E esses seres não são geniais, são “bundões”.
Primordiais espaços periféricos
Cozinha e dependências e Um dia como os outros, textos de Agnès Jaoui e Jean-Pierre Bacri, são ambientados em espaços periféricos. Nem a cozinha, onde se encontram os personagens na primeira história, nem o bar, onde estão os da segunda, despontam como lugares nobres, onde deveriam se desenrolar as ações de cada história. Os personagens se esbarram na cozinha para reclamar do andamento da reunião planejada para um convidado famoso, que não transcorre na sala exatamente conforme o planejado; e se encontram no bar para sair rumo a uma festa de aniversário, partida que, porém, acaba não acontecendo devido à eclosão de um conflito conjugal.
Literatura e teatro, citações e comentários
Toda disciplina ou arte tem, em algum momento, a sua besta negra. A teatralidade já foi a besta negra das artes visuais, o anacronismo é a besta negra para certa noção de História e a literatura é a besta negra do teatro. Não é raro que se diga, ou que se tenha dito, pejorativamente, que determinado espetáculo privilegia o elemento literário em detrimento do teatral.