Autor Edelcio Mostaço

Castellucci e o juízo de deus

23 de outubro de 2013 Críticas
Foto: Divulgação.

A cena é uma porrada. Desferida bem no centro do rosto, naquele ponto entre os olhos que os místicos costumam julgar como do terceiro olho. O espectador fica aturdido, sem respiração, ao final dos sessenta minutos de Sobre o conceito da face no filho de Deus, uma das emblemáticas encenações de Romeo Castellucci para a Societas Raffaello Sanzio (2010) apresentada como atração maior da vigésima edição do Porto Alegre em Cena.

Como outras criações da companhia, também essa coloca em cena não um mero jogo teatral, mas um teorema ontológico complexo, cuja substância conceitual deve ser perquirida pelo espectador. São apenas três cenas: na primeira, a mais longa, um filho dedicado cuida de um pai decrépito que se desfaz em fezes; na segunda, crianças jogam granadas contra a figura de Cristo; e a derradeira, quando essa mesma figura se auto dissolve.

Por onde começar?

14 de novembro de 2010 Críticas
Foto: João Gabriel Monteiro.

Por onde começar? – um dia perguntou-se Roland Barthes, tentando indicar aos jovens que iniciam uma pesquisa possíveis percursos a serem trilhados. Ao longo do texto ele distribui preciosas dicas para ajudar novatos a não sucumbir às muitas e muitas tentações – quase inevitáveis, nestes casos – quando se quer abraçar o mundo com as mãos. Nos jovens, ambição e descontrole costumam ser desmesurados.

Antes da coisa toda começar não é uma pesquisa de linguagem, embora tenha demandado à Cia. Armazém longos laboratórios de investigação – o que é, de saída, a proposta de não dormir sobre os louros conquistados. Esta nova criação está organizada em torno das possibilidades existenciais abertas à vida de três jovens que se interrogam sobre seus limites. A dramaturgia leva a co-assinatura de Maurício Arruda Mendonça e Paulo de Moraes, dupla que já testou suas possibilidades de escritura conjunta em ocasiões anteriores. O que confere ao trabalho – uma estruturação de ações criada em colaboração improvisacional com o elenco – o feitio de coisa de palco; ou seja, um desapego à noção corrente de texto e um investimento rente à cena, um apoio de palavras que, medidas e meditadas, não é simples compilação.

Santo/amargo

19 de março de 2010 Críticas
Foto: Cisco Vasques.

Quase todo mundo conhece a expressão de Marx: “é preciso mudar o mundo e não interpretá-lo”. Helio Oiticica vislumbrou uma outra direção: “é preciso que o mundo seja mundo do homem e não mundo do mundo”. A encenação de O amargo santo da purificação, novo trabalho de rua criado pela Tribo de Atuadores Oi Nóis Aqui Traveiz, de Porto Alegre, segue essa mesma vereda, trazendo à agenda um tema – a transformação do mundo – e uma personagem – Carlos Marighella – bem pouco convencionais.

Cabaré Hamlet ou das várias dificuldades de escrever a verdade

21 de janeiro de 2010 Críticas
Foto: V. Arbelet

De tudo o que vi em 2009 nada me pareceu mais uma “questão de crítica” do que a montagem de  Un Cabaret Hamlet, espetáculo de Mathias Langhoff assistido no Odéon, Paris, numa co-produção com o Théâtre Dijon Bourgogne-CDN.. Seu longo e tedioso nome completo é De casaco vermelho, a manhã atravessa a roseira que, à sua passagem, parece de sangue ou HAM. AND EX BY WILLIAM SHAKESPEARE UN CABARET HAMLET.

A boa e bela alma

10 de março de 2009 Críticas
Foto: divulgação.

A alma existe? Segundo Bertolt Brecht, não.

Para o maior teórico do teatro épico a humanidade prescinde dessa substância que, desde Aristóteles, permeou todas as indagações a respeito da natureza humana, constituída, segundo o filósofo grego, por três dimensões indissolúveis: a vegetativa, a sensitiva e a noética. Também alcunhada de chama, espírito, consciência, princípio vital, entre outras denominações, foi ela tomada como bela – a bela alma – após Schiller e o romantismo alemão, quando passou a reunir a capacidade de, simultaneamente,  ser graciosa (quando a sensibilidade coincide espontaneamente com a lei moral) e virtuosa (quando a vontade é determinada pelo dever), impregnando a cultura alemã com tais traços idealista e transcendente em relação aos instintos.

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Questão de Crítica

A Questão de Crítica – Revista eletrônica de críticas e estudos teatrais – foi lançada no Rio de Janeiro em março de 2008 como um espaço de reflexão sobre as artes cênicas que tem por objetivo colocar em prática o exercício da crítica. Atualmente com quatro edições por ano, a Questão de Crítica se apresenta como um mecanismo de fomento à discussão teórica sobre teatro e como um lugar de intercâmbio entre artistas e espectadores, proporcionando uma convivência de ideias num espaço de livre acesso.

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