O desafio da ausência de conflito

conversa com Daniel Herz

16 de janeiro de 2009 Conversas

Com a carreira estabelecida à frente da bem-sucedida Cia. Atores de Laura, que conduz ao lado de Susanna Kruger, Daniel Herz começou a se exercitar no musical – primeiro em Geraldo Pereira, um Escurinho Brasileiro e depois em Otelo da Mangueira. Diante da boa receptividade de público e crítica alcançada com os dois trabalhos, aceitou o convite do ator Marcelo Serrado para dirigir Tom & Vinicius, atualmente em cartaz no Teatro João Caetano depois de cumprir temporada de quatro meses em São Paulo. Com texto de Daniela Pereira de Carvalho, dramaturga que vem realizando vôos solos após anos de parceria com a Cia. Os Dezequilibrados, o musical valoriza a dimensão poética do encontro entre Tom Jobim e Vinicius de Moraes. 

DANIEL SCHENKER – Por que você decidiu enveredar pelo ramo dos musicais?

DANIEL HERZ – Considero como a dimensão do acaso. Quando fui convidado por Cristina Lara Resende para fazer Geraldo Pereira, um Escurinho Brasileiro, nunca tinha passado pela minha cabeça entrar no campo dos musicais. Logo, desenvolvi parceria com Josimar Carneiro, na direção musical. Na verdade, eu, Josimar e Márcia Rubin formamos uma pequena equipe. Já estamos pensando no próximo trabalho juntos. 

DANIEL SCHENKER – Dirigir um musical é uma experiência muito diferente? E qual foi o desafio específico no caso de Tom & Vinicius?

DANIEL HERZ – É muito diferente, sim. No musical, a dramaturgia é fornecida pela própria música. O fato de existirem momentos dentro do espetáculo nos quais os espectadores “param” e ouvem as músicas precisa ser considerado em termos dramatúrgicos. Em Tom & Vinicius tivemos, evidentemente, um compromisso com a realidade.  Mas nos deparamos com a ausência de conflito na relação de ambos. Não havia, portanto, tensão dramática. Diante disto, procuramos valorizar a dimensão poética do encontro dos dois.

DANIEL SCHENKER – Você tem referências determinantes como espectador de musicais?

DANIEL HERZ – Sim. Hair, sobretudo, que vi no teatro e no cinema. Também cito A Noviça Rebelde e Os Saltimbancos, de Chico Buarque, espetáculo a que assisti no Canecão, ainda durante os anos de repressão (em 1977, com elenco formado por Marieta Severo, Miúcha, Pedro Paulo Rangel e Grande Otelo). 

DANIEL SCHENKER – Você se considera nostálgico?

DANIEL HERZ – Não. Até porque sou desmemoriado. Não tenho muita paciência, por exemplo, para reencontro de amigos de infância. Acho que as coisas têm ou não importância, independentemente da época. Mas sei que para boa parte do público a nostalgia é um elemento que pega. 

DANIEL SCHENKER – Fale um pouco sobre o momento atual da Cia. Atores de Laura:

DANIEL HERZ – Nós terminamos Ensaio de Mulheres e os atores vão começar a ensaiar com Susanna Kruger um trabalho centrado em Fernando Pessoa. É uma companhia que já existe há 15 anos. Amadurecemos juntos. Quando o grupo começou, eu e Susana estávamos na faixa dos 30 anos e a maior parte dos integrantes tinha cerca de 18. Quase todos que fundaram a companhia permanecem até hoje. E enfrentamos o desafio de continuar administrando o Teatro Miguel Falabella, no NorteShopping.

DANIEL SCHENKER – Ao longo do tempo, tenho a impressão de que a Cia. Atores de Laura atravessou por uma transição importante: inicialmente, vocês investiam numa dramaturgia própria (casos de Entrevista e Cartão de Embarque) e, a partir de um determinado momento, passaram a encenar obras de autores diversos…

DANIEL HERZ – De certa maneira, começamos mais autorais e depois sentimos necessidade de nos debruçar sobre textos que admirávamos, como As Artimanhas de Scapino (Molière), Conto de Inverno (William Shakespeare) e, agora, Ensaio de Mulheres (Jean Anouilh), no qual misturamos a própria obra com depoimentos dos atores. Quisemos olhar para estes textos a partir de uma perspectiva contemporânea. Acredito que existe uma boa possibilidade de voltarmos a investir numa criação coletiva.

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