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O conteúdo da forma
Tradução de Denisa Václavová e Joelson Gusson para o texto de Marcela Magdová, publicado originalmente na revista Divadelní Noviny em 19 de outubro de 2011.
Grotesco e elegante, com ritmo modernista tipicamente brasileiro, Manifesto Ciborgue, apresentado no Archa Theatre, junta português, inglês e tcheco. Especial diversão – na noite de quarta-feira no Four Days Festival – misturada com gotas de uma reflexão profunda.
Joelson Gusson, um dos diretores proeminentes no atual cenário do teatro experimental do Brasil, diz ter sido inspirado pelo ensaio homônimo, escrito pela bióloga e filósofa norte-americana Donna Haraway durante os anos 80 do século passado, em que a identidade do “ciborgue” é descrita como uma ligação entre o humano e a tecnologia. Ciborgue como uma espécie de estágio intermediário, de transição, entre o homem e a mulher, ou entre o artificial e o natural. A transformação do corpo humano, seja pela mudança de gênero ou através de intervenções na matéria, é o tema principal desta peça criada para dois performers e um esqueleto.
Ritmo, estratégia crítica
Para falar sobre Manifesto Ciborgue, pode-se partir de diferentes pontos como, por exemplo, o ensaio de Donna Haraway A Cyborg Manifesto: Science, Technology, and Socialist-Feminism in the Late Twentieth Century. Não é disso que se trata essa tentativa de aproximação. Mas duas coisas podem ser pescadas desse título/referência: a questão “manifesto” e o fato de que este espetáculo não toma como ponto de partida uma fábula, uma pesquisa formal ou a experimentação de um modo de fazer, mas dá uma pista de que seu ponto de partida é uma questão, um problema, por assim dizer, do mundo. Ou ainda, parece que o espetáculo parte do conceito mesmo de ciborgue.
Identidade em questão
A particularidade do espetáculo Manifesto Ciborgue, dirigido por Joelson Gusson, parece ser a de ser constituído por uma tensão sutil entre elementos mais propriamente formais, nos quais aparecem um teor crítico, e instâncias subjetivas que desmontam as imposições dessa crítica. A meu ver, a sensação para o espectador é a de que não existe um posicionamento definido, surgindo condições de possibilidade de quebrar com sentidos pré-fixados.