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Negro-vida em oposição ao Negro-tema
Eu tenho direito ao espaço que ocupo na nação, nessa nação.
(…) A terra é meu quilombo. O meu espaço é o meu quilombo.
Onde eu estou, eu estou, onde eu estou, eu sou.
Beatriz Nascimento
O 8° Festival Midrash de Teatro, idealizado por Nilton Bonder, com curadoria de Vilma Melo e Natasha Corbelino, reuniu presencialmente 20 peças teatrais e ações formativas no período de 01 a 28 de maio de 2022 no Teatro Café Pequeno, no Leblon. Foi uma mostra extensa do teatro produzido por artistas negros que estabeleceu um deslocamento geográfico, étnico, político e cultural na cidade. Tratou-se de um festival de Teatro Negro por contemplar produções teatrais que tinham como característica em comum a predominância de artistas negros, contrariamente ao que é praticado no sistema cultural de uma maneira geral. Para mim, o festival buscou evidenciar distintas produções não monolíticas que não reforçassem a ideia de Teatro Negro como monocultura. No entanto, para além dos diversos modos de produção e estéticas, podemos perceber pontos de convergência no que tange às negritudes, termo cunhado pelo poeta martinicano Aimé Cesaire e tão caro a Abdias do Nascimento e ao Teatro Experimental do Negro aqui no Brasil, inspiração para a maioria dos artistas racializados desse país.
Camadas biográficas entre idas e vindas temporais
Turmalina 18-50 é, inicialmente, sobre João Cândido Felisberto, Almirante Negro, líder da Revolta da Chibata ocorrida em 1910. A obra conta em detalhes toda a trajetória de dor e de lutas contra o racismo por parte de Felisberto – nome que lhe foi negado pela Marinha do Brasil à época. Trazer à cena a história desse herói negro, morador de São João de Meriti, mesmo território da Cia Cerne, autora do trabalho, sugere uma duplicidade biográfica no que tange à vida e aos feitos do personagem principal, mas também à identidade que atravessa esse coletivo de artistas. A Cia Cerne integra a Rede Baixada em Cena, organização cultural criada em 2008 na Baixada Fluminense para fortalecer a consciência política e participativa de artistas e produtores da região. A Cia Cerne também é um dos 22 coletivos integrantes da Rede de Grupos de Pesquisa Continuada em Teatro da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a Frente Teatro, que tem como valor expandir territórios e fomentar compartilhamentos entre artistas de todas as regiões do Rio de Janeiro.