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A morte que ninguém pode ver
O grupo Dragão Voador Teatro Contemporâneo se apresentou com o repertório denominado Trilogia da Matéria, até o início de junho, no Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto. As três peças – Manifesto Ciborgue (2009), Paisagem Nua (2011) e Amérika! (2012) – tratam de vícios específicos da sociedade contemporânea: o vício ciborgue, sobre o desejo e viabilidade de transformar o corpo com o uso de próteses; o vício da espetacularização midiática da morte, e a consequente banalização da mesma; e, o vício do consumo, iniciado pela sociedade americana. O que une as dramaturgias é um pensamento voltado para ideia de deterioração, sobre aquilo que, nos atos sociais, contribui para a transfiguração do corpo (a prótese, a morte) e a descaracterização do humano (o consumo). A Trilogia inverte o valor das novidades do nosso tempo, o que para a maioria das pessoas pode ser visto como um comportamento favorável, para este conjunto de artistas, trata-se de um anúncio de falência – da “Matéria” em decomposição.
Posse e destruição
Como extrair dos clichês, imagens que digam do mundo em que vivemos? Essa é uma provocação de Amérika! que, dita de outro modo, propõe ao espectador a renúncia aos modos habituais de se relacionar com os elementos da cultura justamente por meio da incidência sobre o lugar-comum, sobre um saber que não nos pertence, já que perpassa gerações. Para dar a ver algo tão formador de nossas personalidades, como é o consumo, uma das possibilidades é jogar. O termo jogar aqui também tem a feição do brincar infantil. Esse brincar na criança é acompanhado pela imitação e pela inabalável crença no brinquedo. Quando a criança brinca transforma a função e a imagem das coisas num relance. Uma poética que se vale de algo em semelhança com o brincar pode oferecer um distanciamento que estimula a visão de uma duplicidade própria das coisas, uma espécie de dança entre o material original e o objeto elaborado. No caso de Amérika!, o trânsito de personagens e situações-clichês aponta para a crítica na medida em que não existe a crença absoluta nas tipificações – os atores brincam de brincar.