Críticas
Uma trans-dialética
Vol. VIII, nº 65, agosto de 2015
Resumo: O texto reflete sobre a questão contemporânea exposta pelo universo Trans que localiza a alma pelo seu diferimento do corpo. A carpintaria dramatúrgica se vale de uma dialética menos convencional, uma dialética sensível, que dá uma feição de abertura às questões propostas na temática Trans.
Palavras-Chave: Transexualidade; Gênero; Dialética; Corpo; Imagem
Abstract: This paper reflects on the contemporary issue exposed by Trans universe that locates the soul through his body deferral. The dramaturgical carpentry relies on a less conventional dialectic, a sensitive dialectic, which gives an opening feature to the questions proposed in the thematic Trans.
Keywords: Transsexuality; Gender; Dialectic; Body; image
A escrita como (des) propósito
Sabemos que a renovação moderna do teatro liberou encenadores e críticos para uma existência mais livre em relação ao texto. Na medida em que um diretor de teatro não é aquele que encena uma dramaturgia e um crítico também deixa de ser (se é que realmente tenha tido essa sua tarefa) aquele que vai averiguar, julgar se o diretor conseguiu interpretar materialmente o que o dramaturgo escreveu; todo este trabalho vai ficando mais complexo. Por exemplo, um dos equívocos ainda em prática é uma análise que procura ver o lastro que uma dramaturgia constrói sobre um determinado tema. Um texto não é a escrita sobre um tema, um texto é uma escrita do tema. Isso já é uma diferença substancial para analisar a dramaturgia de Sexo neutro. Digamos então que um bom texto não é aquele que trata as palavras como um esclarecimentos de ideias – o artista é mesmo aquele que sabe da irredutibilidade do seres às ideias – mas sim, uma escritura que lida com a resistência das palavras em dizer do ser. A noção de existência nos trabalhos de arte não pode estar associada a uma linha de progresso e esclarecimento (já sabemos isso também), mas justamente à opacidade e a espontaneidade infinita da existência.
Overdrive
Vol. VIII, nº 65, agosto de 2015
Resumo: A crítica de Caranguejo Overdrive, d’Aquela Cia., com direção de Marco André Nunes e dramaturgia de Pedro Kosovski, reflete sobre conceitos de conflito e sua representação na forma da cena, e aproxima a estética do corpo sem órgãos artaudiano da interpretação dos atores.
Palavras-chave: conflito, forma, estranhamento, teatro político, corpo sem órgãos, Manguebeat
Abstract: This review of Caranguejo Overdrive, a play by Aquela Cia., directed by Marco André Nunes and written by Pedro Kosovski, reflects on different concepts of conflict and its representation on stage. It also approaches the artaudian aesthetic theory of the body without organs concerning the actors work.
Keywords: conflict, form, strangeness, political theater, corpo sem órgãos, Manguebeat
Beat
Na segunda vez que fui assistir ao espetáculo, conversei com o diretor Marco André Nunes por algum tempo do lado de fora do Sesc Copacabana. Uma memória de infância me levou a perguntar sobre os caranguejos que fazem parte da cena; sobre como eles são mantidos e de onde vêm. Marco André disse que detém autorização legal para usar os animais e que todos são recolhidos de um restaurante, antes de virarem comida (ciclos). Porém, durante o processo, a equipe teve que aprender a cuidar dos caranguejos, e nesse decorrer alguns animais morreram. As suposições levaram a mudar os animais de espaço e alimentação, e, embora caranguejos não possam comer alface (“alface nunca!”) e o trato com os mesmos tenha se tornado mais delicado e habilidoso, ainda assim, as mortes não eram evitadas. Acontece que a equipe usava apenas um caranguejo de cada vez, e segundo pesquisa dos atores, caranguejos não podem ficar sozinhos. A solidão torna o caranguejo letárgico e inativo, paralisando-o e o levando à morte. Caranguejos precisam de outros caranguejos. Para brigarem. Para que se mexam. A vida do caranguejo depende da existência da ameaça, do conflito. Do outro.
Laio e Crísipo: a Pop e o esquecimento
Vol. VIII, nº 65, agosto de 2015
Resumo: A crítica reflete acerca de uma pesquisa anterior da Aquela Companhia sobre a Pop-art no espetáculo Edypop, ligando-a ao exercício de montagem de uma obra que tematiza o esquecimento de um mito antigo acerca do relacionamento amoroso entre Laio e Crísipo. Além disso, discutem-se os entrecruzamentos com o aspecto crítico do pastiche utilizado pela obra.
Palavras-chave: pop, esquecimento, pastiche, paixão
Abstract: The paper reflects on the Aquela Companhia’s previous research on Pop Art in the play Edypop, linking it to the exercise of a work about the oblivion of an old myth that tells the story of the relationship between Laius and Chrysippus. In addition, we discuss the intersections caused by critical aspects concerning the usage of pastiche in the play.
Keywords: pop, oblivion, pastiche, passion
O espetáculo Laio e Crísipo, escrito por Pedro Kosovski e dirigido por Marco André Nunes, surgiu como um prolongamento criativo de questões já presentes no processo de pesquisa de Edypop. É sabido que, em Édipo Rei de Sófocles, Laio aparece apenas como um referente mítico de um crime do passado, não sendo, pois, agente da tragédia. Esse fato deve ser observado na peça anterior da companhia, pois, diferente da obra sofocliana, Laio (interpretado por Remo Trajano) já ocupava um espaço privilegiado na trama.
O trans e a trans: fábula mundo
Vol. VIII, nº 65, agosto de 2015
Resumo: Crítica dos espetáculos A geladeira e O homossexual, ou a dificuldade de se expressar, de Raul Damonte Botana, mais conhecido como Copi, à luz do conceito de ator-travesti cunhado pelo próprio artista e retrabalhado nas encenações dirigidas, respectivamente, por Thomas Quillardet e Fabiano de Freitas. Os trabalhos fizeram parte da Ocupação Copi ocorrida no SESC Copacabana e no Museu de Arte do Rio, em julho deste ano.
Palavras-chave: Copi, transgênero, ator-travesti
Abstract: Critical review of the plays A geladeira and O homossexual, ou a dificuldade de se expressar, written by Raul Damonte Botana, known as Copi. Both works – the former directed by Thomas Quillardet and the later by Fabiano de Freitas – shape their own reading of the concept of the “transvestite actor”, a concept created by Copi to define most of his work. The plays were part of the event Ocupação Copi, that took place last July in Rio de Janeiro.
Keywords: Copi, transgender, transvestite actor
Observo no google as imagens do argentino Raul Damonte Botana (1939-1987), e tento imaginá-lo em proximidade e concretude. Travestido de drag ou de modelo Tom of Finland, ele incorpora o que normalmente conceberíamos como o “ator-travesti”, conceito cunhado pelo próprio artista para definir estética e ideologicamente boa parte de seus trabalhos. Contudo, acredito que nas imagens do cotidiano podemos também flagrar esse conceito tão central na obra do autor. Vejo no olhar risonho, sardônico mesmo nas poses mais despretensiosas e contidas, uma espécie de humor irreverente que parece denunciar em germe o ator-travesti por trás do corpo franzino e pálido, tão branco que sua avó o chamará “copito de nieve”, originando mais tarde o apelido / nome artístico com que ficaria conhecido: Copi. O olhar do autor de Loretta Strong parece resistir como o próprio enigma do ator-travesti – enredado nos fluxos metamórficos e transitórios, entre as diversas identidades, gêneros e sexualidades –, mas encerrando sempre um inevitável gosto pelo riso debochado e pela crítica ferina dos costumes.
Dedando Copi
Vol. VIII, nº 65, agosto de 2015
Resumo: O presente artigo traça considerações a respeito do cu e da ideia de fracasso na dramaturgia de Copi a partir da montagem de O Homossexual ou a dificuldade de se expressar realizada pelo Teatro de Extremos. Analisa as escolhas da encenação ao comentar a atuação dos atores Renato Carrera e Mauricio Lima, suas estratégias de enunciação e operações cênicas. Os conceitos que embasam essa escrita são oriundos da Teoria Queer, dos estudos subalternos, das teorias da performance e do teatro contemporâneo.
Palavras-chave: Copi, dramaturgia, cu, queer, fracasso
Abstract: This article draws considerations towards the asshole and the idea of failure in Copi’s dramaturgy through the staging of O Homossexual ou A Dificuldade de se Expressar by Teatro de Extremos. It analyses the scene while commenting on the performance of actors Renato Carrera and Mauricio Lima, their enunciation strategies and scenic operations. The concepts that grounds this writing come from Queer Theory, subaltern studies, performance theories and contemporary theater.
Keywords: Copi, dramaturgy, asshole, queer, failure
Não é a língua, é o cu! – berra o ator Renato Carrera na montagem de O homossexual ou a dificuldade de se expressar de Copi, com realização do Teatro de Extremos (Rio de Janeiro, SESC Copacabana, junho/2015). O texto expõe a saga de Senhora Simpson (Renato Carrera) e Irina (Mauricio Lima) que estão exiladas na Sibéria e sugere a transexualidade das personagens como causa para tal desvio de rota. Além delas, Madame Garbo (Leonardo Corajo), professora de piano com quem Irina mantém relações sexuais, seu ex-marido Oficial Garbenko (Higor Campagnaro), também amante de Irina, e o General Pouchkine (Fabiano de Freitas) completam a trama. As cinco personagens se envolvem em uma possível fuga para a China e no entre da relação sobre ficar ou partir deixam-se revelar.