Críticas
Quanto texto, quanta estupidez

Em cartaz no Teatro II do CCBB – RJ durante os meses de abril e maio, a Companhia Os Dezequilibrados comemora seus quinze anos com a encenação do texto A estupidez, do dramaturgo argentino Rafael Spregelburd. O texto faz parte de uma heptologia inspirada no quadro de Hieronymus Bosch, A roda dos pecados capitais. Em foco estão os supostos pecados do homem contemporâneo. Por exemplo, dentre os outros textos que fazem parte da série estão A paranoia e A teimosia. A escolha, da Companhia, por A estupidez revela o desejo de falar, claro, da estupidez humana, e também evidencia um processo marcado pela presença primordial do texto.
Shakespeare para jovens de coração

R&J de Shakespeare – Juventude Interrompida texto do americano Joe Calarco (que estreou em Londres ainda nos anos 70) teve esse ano uma versão carioca dirigida por João Fonseca, que começou com uma temporada na arena do Espaço SESC, passou pelo Teatro Glaucio Gill e em seguida foi para o tradicional palco italiano do Teatro Carlos Gomes. O texto mostra quatro alunos de um colégio rigoroso em Londres onde, entre os estudos, a rigidez dos professores, o dever das lições e orações, pairam quatro jovens que decidem encenar Romeu e Julieta no momento em que lhes é permitida a descontração do recreio escolar.
A poética do espectador

Solano e Rios são dois atores que perambulavam pelas estradas empoeiradas de uma Espanha medieval, herdeiros de uma tradição cômica dotada de cinismo, ironia e alegria e que, muito provavelmente, faziam a festa da multidão em eventos não oficiais, tanto nas praças quanto nas feiras públicas do longínquo século XVII. Mikhail Bakhtin já havia identificado o caráter anárquico e carnavalesco desse pano de fundo social-popular na obra literária de François Rabelais. E é no interior desse contexto histórico que os dois pândegos famintos se desviam de suas rotas, fugindo de cobradores que resolvem acertar suas contas, e acabam caindo de pára-quedas na, não menos anárquica, festiva, idosa e erótica Copacabana, Espaço SESC, no Rio de Janeiro do século XXI. Deixam para trás sua terra natal e caminham longe, cruzando as fronteiras mais vastas de estilos, estéticas e influências artísticas.
Submersão e respiração de uma dramaturgia com teor de cena

O melhor modo de apresentar as idéias que surgiram a partir do espetáculo Ninguém falou que seria fácil talvez seja tentar esboçar os traços de um pensamento que ainda não pode ser consumido pela escrita. O que seria um lugar comum da escrita, o fato de ser uma expressão da linguagem e, portanto, conter uma medida de indizível e de disforme, se evidencia pela matéria mesma do espetáculo configurado por uma narrativa que busca um trânsito entre a postura dos criadores, dos atuantes e dos receptores. Minha perspectiva aqui foi fisgada pelo o que Daniele Avila escreveu no texto que está no programa. Para refletir sobre o trabalho desenvolvido pela companhia Foguetes maravilha, dirigida por Felipe Rocha em parceria com Alex Cassal, ela se refere a uma dramaturgia singular e emblemática:
O teatro como extrema unção aos crimes hediondos

Guerras, com todas as suas incongruências e todo o seu fatídico cenário de genocídio, carnificina, destruição e mutilação costumam produzir, contraditoriamente, um rico, fascinante e instigante material artístico. Quanto maiores e mais absurdos são os atos provocados pelos homens, mais contundente é o seu esmiuçar nas artes. A Guerra Civil espanhola – que ocorreu entre 1936/1939 – foi o acontecimento mais traumático que ocorreu antes da 2ª Guerra Mundial. Nela estiveram presentes todos os elementos militares e ideológicos que marcaram o século XX. Podemos dizer, sem margem de dúvidas, que foi um dos três piores momentos vividos pelo mundo ocidental no século passado. Junto com o fascismo italiano e o nazismo alemão – talvez o mais hediondo de todos eles -, nada foi mais trágico do que estes três acontecimentos. O que poderia ser uma guerra interna, apenas espanhola, ganhou contornos exteriores, pois o que estava em jogo também era a hegemonia do mundo, dividido entre duas forças: a do capitalismo (direita) e o socialismo (esquerda). Assim, pode-se dizer que a Alemanha nazista e a Itália fascista apoiavam o golpe do General Francisco Franco enquanto a União Soviética se solidarizou com o governo Republicano.