Autor Daniele Avila Small
Uma verdade ainda negativa

O estrangeiro, peça em cartaz no Mezanino do Espaço SESC, é uma adaptação de Morten Kirksov para o romance homônimo de Albert Camus, com tradução de Liane Lazoski. Em cena, Guilherme Leme, que assina a direção junto com Vera Holtz, conta a história de seu personagem, Mersault, na primeira pessoa. Mersault é, a princípio, um homem comum. Aos poucos, percebemos que algumas fronteiras entre o comum e o incomum se romperam e que o limite entre o espaço do indivíduo e o espaço da sociedade está sendo apresentado como algo bastante complexo.
A cena da cidade
Natasha Corbelino é responsável pela iniciativa de intercâmbio entre grupos de teatro no Rio de Janeiro A cena da cidade.
DANIELE AVILA – Como se constituiu A cena da cidade, quais são seus os objetivos e pressupostos?
NATASHA CORBELINO – A Cena da Cidade começou como um movimento despretensioso gerado pela necessidade de aproximação entre os profissionais de teatro do Rio, pela carência de diálogo e cumprimentos entre nós e pela curiosidade para mapear os trabalhos/propostas. A partir de uma necessidade de abrir espaço na cidade para encontros que me permitissem saber os nomes e rostos de quem está a meu lado fazendo o mesmo trabalho, dei origem aos primeiros contatos em 2007. A resposta ao meu primeiro email foi tão grande e ativa que confirmei o óbvio: o desejo do encontro era dominante.
Palhaço de nariz sutil

Vaca de nariz sutil é a segunda adaptação de um romance de Campos de Carvalho que faz temporada no Teatro Poeira. No entanto, é difícil ver rastros e O púcaro búlgaro, encenado por Aderbal Freire-Filho em 2006, nesse espetáculo dos parlapatões que veio para cá depois de fazer temporada em São Paulo. A adaptação do grupo paulista buscou transformar o romance para a cena, opção oposta àquela do romance em cena de Aderbal. Para o público carioca, a experiência de assistir a essas duas montagens é interessante. É possível ver caminhos bem distintos para a encenação do universo de Campos de Carvalho e pensar a relação entre cada romance e cada peça.
Do livro ao palco

A produção paulista O natimorto, adaptação do romance de Lourenço Mutarelli feita por Mario Bortolotto – que também assina a direção – veio fazer temporada no Rio de Janeiro, assim como as peças Vaca de nariz sutil, texto de Campos de Carvalho encenado pelos Parlapatões, e Hotel Lancaster, texto de Bortolotto dirigido por Marcos Loureiro. Vaca de nariz sutil encontrou seu lugar no Teatro Poeira, palco de estréia de outro romance de Campos de Carvalho, O Púcaro búlgaro, encenado em 2006. Já Hotel Lancaster foi inserido na programação da Sala Multiuso do SESC, espaço que acolhe, vez por outra, espetáculos pouco convencionais. Até aqui, é possível ver uma combinação de situações favoráveis para a vinda destas três peças de São Paulo para o Rio. No entanto, O Natimorto veio fazer temporada no Teatro do Leblon, que não parece ter o perfil do espetáculo.
Homenagem à paródia
Em um texto publicado há pouco, comentei que o teatro carioca apresentou, recentemente, alguns trabalhos solos bem interessantes. Esses trabalhos colocavam em movimento alguns pressupostos estabelecidos sobre nossas noções de atuação e de construção de personagem e permitiam que os atores trouxessem à tona, na materialidade da cena, suas teatralidades particulares. Parece, no entanto, que o público, de um modo geral, tem um certo preconceito contra monólogos. É como se a idéia de monólogo fizesse vir à mente o enfado de um discurso pedante, de um depoimento ou, quem sabe, de alguma espécie de sermão. E é justamente com o formato de sermão que a peça The Cachorro Manco Show brinca, misturando-o com outros formatos monológicos, em voga nos dias atuais: a stand-up comedy dos palcos e a fala dos pedintes das ruas.