Críticas

Oralidade e fragilidade estética

20 de junho de 2008 Críticas

O grupo Etu-Lene, de Angola, participou do FESTLIP, com o espetáculo Atiraram o velho Katy-Ngotè para sua última morada. O cenário do espetáculo consiste em um pano branco estendido ao fundo da sala Multiuso (do Sesc Rio) e funciona como uma coxia de onde os atores entram e saem de cena. A encenação frontal parece estruturada conforme os antigos programas de comédia televisivos, cujos atores, sempre tendo em vista essa perspectivação, desfilavam seus personagens caricatos, se dirigiam diretamente à platéia, sempre mediados por uma figura mais sensata, inteligente, que estava lá geralmente lendo o seu jornal. Esse tipo de figura funcionava como um intermediador que sinalizava, com certa consciência e discernimento, a ambigüidade dos personagens e favorecia a reflexão da assistência. Neste espetáculo não existe a tal figura sensata. Todos os quatro personagens são, de certo modo, tipificados: o filho em idade de casar, o pai, velho e intransigente, a amada do rapaz, a noiva escolhida e o amante dela. A inexistência de contrapontos favorece certos tons moralizantes e dificulta o surgimento de outros sentidos, que não os do senso comum.

Elogio à alteridade

10 de junho de 2008 Críticas
Foto: Marcus Claussen

O texto de Adriano Shaplin utiliza uma fórmula de ação comum ao gosto da cultura norte-americana acostumada com as tramas Hollywoodianas, porém é contra a formação destas que ele constrói sua denúncia. É transparente na peça a raiva que o inspirou a escrever sobre o casamento da mídia Americana com a política militar de intervenção externa do governo Regan-Bush, criando imagens que pudessem ser mobilizadas para produzir a aprovação das guerras deste governo. Segundo o autor, a peça também pode ser vista como uma comédia, já que ele usa a caricatura para ressaltar os valores que considera corrompidos. Furiosamente inspirado na guerra do Iraque, iniciada em 2003, Shaplin recorre à realidade dos mariners para contar sua estória.

Mosaico de atuações

10 de junho de 2008 Críticas
Foto: Guga Melgar

Na peça O Jardim das Cerejeiras de Anton Tchekhov, dirigida por Moacir Chaves, uma primeira imagem se coloca para o espectador: um mosaico de tapetes entremeados de pequenos retângulos de grama artificial está estendido sobre o chão e pode ser visto desde o momento em que o público entra no teatro. Ao longo da peça, o mosaico permanece sempre em cena e às vezes ganha um tratamento especial da iluminação. É possível fazer associações entre os recortes de tapete e de grama que coexistem naquela imagem e as diferentes formas de ver o mundo que convivem na peça. O cenário e a iluminação apresentariam, dessa forma, uma metáfora para a fábula.

Um modo de estar no tempo

10 de junho de 2008 Críticas
Atores: Otto Jr e Julia Lund. Foto: Guga Melgar

O espetáculo Nu de mim mesmo parece nos propor uma experiência no tempo. E assim como o sujeito falante de Primeiro amor de Samuel Beckett, estar no tempo requer que nos balizemos por eventos afetivos de nossa história. Para resgatá-los e enfrentá-los é preciso rememorar, entrar em contato com as ruínas que sobraram do nosso esquecimento. Em Beckett foi preciso voltar ao túmulo do pai e anotar a data de sua morte, para mais tarde voltar e anotar a data do seu nascimento. Começa-se pelo fim para depois voltar ao início.

Ponto sem partida

10 de junho de 2008 Críticas

Com Memória afetiva de um amor esquecido, a companhia Os Dezequilibrados continua investindo nas suas principais propostas – em especial, o trabalho em espaço não-convencional, o vínculo com a gramática cinematográfica e o deslocamento do espectador de uma posição meramente passiva.

Entre estas características, a utilização do espaço não-convencional é, sem dúvida, a mais bem administrada pelo grupo, que investe num espetáculo itinerante pelos oito andares do prédio do Oi Futuro. A verticalidade deste espaço é aproveitada pelo diretor Ivan Sugahara, que já tinha realizado expressiva “ocupação” do quarto de um apartamento em Um quarto de Crime e Castigo e do hall de um cinema em Vida, o filme. Neste novo trabalho, o diretor nem sempre procura aproximar o universo abordado do espaço escolhido, por mais que as instalações do Oi Futuro sejam inicialmente aproveitadas como referentes às da clínica Be Happy, especializada em apagar memórias dolorosas das mentes de seus clientes.

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Questão de Crítica

A Questão de Crítica – Revista eletrônica de críticas e estudos teatrais – foi lançada no Rio de Janeiro em março de 2008 como um espaço de reflexão sobre as artes cênicas que tem por objetivo colocar em prática o exercício da crítica. Atualmente com quatro edições por ano, a Questão de Crítica se apresenta como um mecanismo de fomento à discussão teórica sobre teatro e como um lugar de intercâmbio entre artistas e espectadores, proporcionando uma convivência de ideias num espaço de livre acesso.

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