Autor Pedro Manuel
Um outro o mesmo
“Mentir, o enunciar de coisas belas e falsas, é o verdadeiro fim da Arte”
Oscar Wilde, Intenções
Pretexto
Começamos a digressão em torno da noção de Personagem Intermédia por um breve pretexto, a própria noção de personagem, no sentido que João Brites atribui a um pretexto, “uma ideia que conduz à acção”.
A ideia da personagem como ser vivente modificou-se no teatro na viragem para o sec. XX. Se, até aí, o paradigma literário caracterizava a primazia da criação teatral, agitava-se então a passagem para um paradigma espectacular, que caracteriza ainda o teatro no recurso aos seus próprios meios e linguagens. Este questionamento do estatuto da personagem conduziu a estratégias diversas de representação dos modos de ser humano, da apresentação de personas e, sobretudo, das condições de ser outro, premissa fundamental da invenção e presença de personagens.
Cidadão de Beirute
Rabih Mroué é diretor da peça Yesterday’s Man, que faz parte da programação de inauguração do Teatro Tom Jobim.
PEDRO MANUEL – O título who’s afraid of representation? pretende estabelecer uma relação com as restrições à produção de imagens pela religião islâmica, como no caso da representação de Maomé?
RABIH MROUÉ – Eu não faço essa relação de forma directa. Faço antes uma relação com o momento presente, há um problema sobre como fazer teatro, como pode um actor representar uma personagem como Hamlet?
PEDRO MANUEL – E porque é um problema?
RABIH MROUÉ – Já não consigo acreditar. E, ao mesmo tempo, é também porque estou a lidar com assuntos políticos e religiosos da minha região. Quando sou bombardeado com milhares de imagens por dia pelos media, pergunto-me: estou nesta parte do mundo, posso produzir mais imagens? é-me permitido produzir imagens? Parece-me que há uma espécie de impossibilidade, até porque estamos numa região onde já temos a nossa imagem feita, nós não estamos a produzir as nossas imagens, elas são produzidas por outros.
Sombra
Texto publicado originalmente na Revista Obscena, nº6, pp. 75,76
Vejamos Os vivos em linha com Morcegos (2006) e mesmo com Ensaio sobre a cegueira (2005). Em comum, a origem dialógica dos textos, que subsiste parcial ou completamente na adaptação dramatúrgica; a impressão da marca urbana, onde a estranheza e a excepção se instalam e progridem; a cenografia representativa, quase figurativa, onde, no entanto, se mantém o exercício de dramatografia de João Brites (uma visão dramatúrgica da cenografia, uma leitura cenográfica do texto).