Autor João Cícero Bezerra
Totem-fetiche – os limites do corpo
Sobre a obra Totem-Fetiche, apresentada na Exposição FRONTEIRAS – Corpo, Visualidade e Política, com curadoria de Felipe Scovino e Giselle Ruiz, em cartaz na galeria do Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto entre os dias 27/06 e 28/07, no Rio de Janeiro.
JOÃO – Evângelo, fale um pouco do título da sua obra.
EVÂNGELO – Acho interessante você começar me perguntando sobre o título, pois poucas pessoas me abordaram a partir dessa provocação. O título é um convite a discussões maiores, talvez maior do que o próprio trabalho. Procuro questionar a relação possível de se pensar o paradigma do corpo na nossa sociedade, ainda como tabu, sabendo que existe uma relação entre totemismo e tabu. Também convido a pensar a nudez. Numa exposição de arte contemporânea isso é até mais fácil de ser aceito. São corpos virtuais, em imagens de alta definição, de pessoas nuas, em escala natural, em combinações que misturam masculino e feminino, preto e branco. Encontrar esse “corpo” é comum?
O enigma do real
O espetáculo Garras curvas e um canto sedutor, texto de Daniele Avila Small e direção Felipe Vidal, que esteve em cartaz na Casa de Cultura Laura Alvim, trouxe ao tablado a construção de um espetáculo realista, em que o tratamento do real parte de uma compreensão filosófica diversa da comumente associada às obras que se emaranham na problemática do realismo.
Grandes trabalhos artísticos se construíram e se constroem em relação direta com o real, ainda que tenham a consciência de que esse é sempre uma convenção de linguagem, isto é, um modo de operação da mímesis com os códigos ou com as leituras dos mesmos no mundo concreto.
O peso do referente
Vazio é o que não falta, Miranda, espetáculo do Teatro Inominável, dirigido por Diogo Liberano, expõe o cansaço de uma companhia jovem em lidar com a autorreferência do teatro contemporâneo. Possivelmente, o grande risco da peça, tão mencionado pelo diretor, seja a falta de tônus em segurar (refletir sobre) o referente, entendendo o grande vácuo presente no próprio e a falta de conhecimento (experiência) sobre o mesmo. Por isso, cabe uma reflexão sobre o sentido de vazio presente na peça do grupo. A obra segue o seguinte mote: um diretor, Liberano, e quatro atrizes, Adassa Martins, Caroline Helena, Flávia Naves e Natássia Vello resolvem montar Esperando Godot de Samuel Beckett. Imersos na obrigação inalcançada de fazer uma peça canônica de teatro, o grupo constrói diferentes jogos no palco. É o caso do jogo de improvisação com o dicionário e do sorteio com a plateia das intérpretes que farão as personagens na peça de Samuel Beckett.
A luz no lugar escuro
O espetáculo teatral O lugar escuro, dirigido por André Paes Leme e escrito por Heloisa Seixas, pretende lançar luz sobre um tema que vem ocupando a população mundial recentemente: o mal de Alzheimer. Com a ampliação da expectativa de vida dos idosos nos grandes centros, surge a demanda de se refletir acerca dos problemas pertencentes a esta fatia da sociedade.
O fato de a doença atingir em grande parte idosos, agindo sob o cérebro dos mesmos, apagando suas memórias e causando um quadro de demência, faz-nos observar uma representação da loucura distinta da esquizofrenia e de outras doenças neuropsicológicas que tocam pessoas mais moças, que, por vezes, já apresentam seus sintomas de insanidade desde o momento do nascimento.
Arte-violência e a pluralidade de contextos
A peça escrita por Pedro Kosovski e dirigida por Marco André Nunes, que esteve em cartaz no teatro arena do Espaço SESC, em Copacabana, Cara de Cavalo, é um grande desafio de pragmática crítica. O termo pragmática é utilizado em linguística para nomear a ciência que identifica os contextos de produção dos discursos, a fim de construir uma interpretação do significado dos termos, percebendo que esse só pode ser decifrado dentro do campo discursivo no qual está inserido. E a peça em questão pretende, sobretudo, colocar lado a lado a discussão sobre arte-violência através de duas linhas referenciais (às vezes, cruzando as mesmas e outras vezes as separando), aludindo à espetacularização da violência cotidiana nas tragédias cariocas de Nelson Rodrigues e adentrando no discurso sobre arte-violência que foi construído por Hélio Oiticica através da figura marginal de Manoel Moreira – conhecido como Cara de Cavalo.