Autor Dinah Cesare

Um modo de estar no tempo

10 de junho de 2008 Críticas
Atores: Otto Jr e Julia Lund. Foto: Guga Melgar

O espetáculo Nu de mim mesmo parece nos propor uma experiência no tempo. E assim como o sujeito falante de Primeiro amor de Samuel Beckett, estar no tempo requer que nos balizemos por eventos afetivos de nossa história. Para resgatá-los e enfrentá-los é preciso rememorar, entrar em contato com as ruínas que sobraram do nosso esquecimento. Em Beckett foi preciso voltar ao túmulo do pai e anotar a data de sua morte, para mais tarde voltar e anotar a data do seu nascimento. Começa-se pelo fim para depois voltar ao início.

Acúmulo e destruição/Pesadelo logístico

10 de maio de 2008 Processos

Atriz: Emeileine Zarp. Foto: divulgação.

Acúmulo e destruição
Por Dinah Cesare

A obra é realmente uma coisa cheia de enigmas. Ela tem a particularidade de ser potência de atualização. O que eu quero dizer é que não é uma questão da obra incidir sobre nossa memória pura e simplesmente: ela tem a potência de atualizar nossos afetos durante o evento. E isso acontece por meio das estruturas mentais do indivíduo, que durante aquele determinado tempo funcionam de modo diferenciado dos momentos ordinários. Creio que o trabalho em processo Um homem e três janelas, que está sendo apresentado no Café Cultural, formaliza sua fisionomia na tensão própria ao funcionamento do embrião de uma nova máquina – entre as engrenagens originárias e uma nova tecnologia. A estrutura do jogo da memória que a uma das atrizes desenha à nossa frente é jogo por natureza e máquina por conta de sua destreza tensa.

O processo – Teatro na Justiça

10 de maio de 2008 Críticas

O projeto Teatro na Justiça, dirigido por José Henrique, procura investigar obras “fundamentais para a compreensão de valores da Justiça” e apresentar os resultados deste trabalho em forma de “espetáculo-leitura”. O processo, em cartaz no Teatro Maison de France, adaptação da obra homônima de Franz Kafka, é a segunda dessas produções que é transformada em encenação para o circuito teatral. A primeira obra encenada foi A pane, de Friedrich Dürrenmatt. Essas duas escolhas parecem apontar para a discussão de valores surgidos na modernidade que fizeram frente aos modelos metafísicos que defendiam princípios eternos e objetivos. No contexto moderno pós-metafísico, o homem precisa operar suas próprias leituras e arriscar sentidos para a história. Esse pensamento parece caro ao projeto do Teatro na justiça, sobretudo por ter fundamentado seu trabalho na relação entre teatro e literatura, que pressupõe operações de releitura, tanto por parte da adaptação dramatúrgica quanto da direção, dos atores, dos procedimentos cênicos, e conseqüentemente, do público. Portanto, a releitura, ou seja, a construção própria da história, parece ser uma das perspectivas possíveis para analisar o espetáculo.

Quando a tecnologia é transformada em efeito

15 de abril de 2008 Críticas
Foto: divulgação.

O espetáculo What’s wrong with the world?, em cartaz no Oi Futuro, conforma uma proposta inovadora: quebrar as barreiras geográficas e subjetivas entre os continentes pela cena simultânea no Brasil (Rio de Janeiro) e na Inglaterra (Londres), transmitida ao vivo via internet streaming – “tecnologia que possibilita transmissões ao vivo em broadcasting – rádio, TV e teleconferência.” O espetáculo integra a série Play on earth das companhias Philia 7 e Station house opera, que, em sua primeira edição brasileira, em 2006, contou ainda com a participação da Theatre works, de Singapura. A idéia que o projeto sugere é a de que a pesquisa de linguagem, atualizada em tempo real pela internet e desenvolvida por cada companhia através de suas próprias construções cênico-dramatúrgicas, discuta a virtualidade, a troca de informações por indivíduos distintos e, talvez, a transformação lúdica do nosso conceito de diáspora. Contrariamente a diáspora, que figura os povos (pertencimento) espalhados pelo mundo em comunidades, a proposta do espetáculo parece destruir a noção dessas comunidades como porções subjetivas. O subjetivo é intercontinental.

Dramaturgia e cena – potências em tensão

10 de abril de 2008 Críticas
Atrizes: Cristina Flores e Marcia do Vale. Foto: divulgação.

A feminista Valerie Solanas publicou em 1968 o SCUM Manifesto – Society for cutting up men. Esse manifesto apresenta uma postura radical e contundente, sem disposição para o diálogo, propondo a aniquilação do homem. Solanas, atriz e escritora, foi uma figura incomum, que debateu o capitalismo, mendigou nas ruas e foi bissexual assumida. Porém, a feminista que ficou em nossa memória foi Beth Friedman, que tinha um discurso mais apaziguador, que falava diretamente à dona de casa e acabou tendo como máxima: queimem os sutiãs! Solanas atirou a queima roupa em Andy Warhol no interior da Factory. Warhol nunca se recuperou totalmente. A figura de Solanas e seu manifesto inspiraram a dramaturgia do espetáculo Onde você estava quando eu acordei?, que está em cartaz na Casa do Mercado.

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Questão de Crítica

A Questão de Crítica – Revista eletrônica de críticas e estudos teatrais – foi lançada no Rio de Janeiro em março de 2008 como um espaço de reflexão sobre as artes cênicas que tem por objetivo colocar em prática o exercício da crítica. Atualmente com quatro edições por ano, a Questão de Crítica se apresenta como um mecanismo de fomento à discussão teórica sobre teatro e como um lugar de intercâmbio entre artistas e espectadores, proporcionando uma convivência de ideias num espaço de livre acesso.

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