Isto não é um espetáculo

Crítica da peça Este lado para cima – isto é e não é um espetáculo, da Brava Companhia, de São Paulo/SP

19 de outubro de 2011 Críticas

O espetáculo Este lado para cima – isto é e não é um espetáculo, da Brava Companhia, de São Paulo/SP, apresentou-se na Praça Nove de Julho, de Presidente Prudente, nos dias 1 e 2 de setembro. Este foi um dos mais expressivos espetáculos desta edição do Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente.

Por meio da alegoria, a Brava Companhia conta a história do surgimento e progresso de uma cidade, cujo fundador é simplesmente Ninguém. O espetáculo evidencia as formas de opressão e exploração do homem nesta fictícia cidade, utilizando-se dos recursos do gestus e do estranhamento brechtiano. Esse procedimento cria diversas interrupções ao nível da fábula, desvirtuando os sentidos habituais de comportamentos e atitudes do cotidiano, transformando-os em cenas de terror e tortura. Em verdade, o espetáculo faz constantemente alusão a todas as formas de totalitarismos: políticos, religiosos, culturais e intelectuais. Seu objeto de reflexão é o homem diante de um mundo opressor. É um ato de rebelião artística e de conscientização sobre a realidade. Pode ser didático em alguns momentos, mas não deixa nunca de ser dialético. Essa é inclusive uma de suas características mais marcantes. E também não perde a beleza.

A cena em si já se apresenta como um ato de protesto, uma guerrilha teatral. Os atores surgem em cortejo, vestidos como guerrilheiros, com adereços em ferro que podem assumir funções variadas: desde armas até instrumentos musicais. A música pauta todo o espetáculo, expandindo o caráter contestatório e, ao mesmo tempo, lúdico da encenação, que tem no trabalho dos atores o seu leitmotiv e a sua maior riqueza. De espírito anárquico e grande capacidade de improvisação, o elenco conduz o espetáculo com maestria.

Em uma visada dialética, no subtítulo do espetáculo se diz “isto não é um espetáculo”, chamando a atenção para a importância dos eventos narrados e apresentados em cena, que não são mera ficção. Todavia, ao longo da representação, ela está sempre a se evidenciar enquanto artifício, produção simbólica. Nisso então a Brava Companhia demonstra não perder de vista o prazer e o conhecimento, a diversão e a aprendizagem, na experiência estética e política. Há então uma fricção entre ilusão e realidade que não pretende apagar fronteiras, mas instigar o exercício do pensamento dialético na cena de modo criativo e lúdico.

Newsletter

Edições Anteriores

Questão de Crítica

A Questão de Crítica – Revista eletrônica de críticas e estudos teatrais – foi lançada no Rio de Janeiro em março de 2008 como um espaço de reflexão sobre as artes cênicas que tem por objetivo colocar em prática o exercício da crítica. Atualmente com quatro edições por ano, a Questão de Crítica se apresenta como um mecanismo de fomento à discussão teórica sobre teatro e como um lugar de intercâmbio entre artistas e espectadores, proporcionando uma convivência de ideias num espaço de livre acesso.

Edições Anteriores