Notas sobre o corpo e sua condição de cadáver – paradoxos e procedimentos do corpo treinado

Estudo sobre o treinamento do ator

28 de abril de 2010 Estudos

Parece existir uma espécie de lacuna entre as práticas de treinamento de atores e as possibilidades de transformação das mesmas em pensamento teórico para além das salas de ensaio. Talvez, essa defasagem se deva ao paradoxo que é próprio da linguagem teatral de ser, na realidade, um pensamento que se revela como matéria posta em cena. Daí a dificuldade de formular teorias sincrônicas entre as práticas atoriais e as possibilidades de pensamento que delas advêm. Podemos incluir aqui nessa questão o fato de que as referidas práticas estão, de certo modo, envolvidas em uma zona sempre de deslocamentos, na medida em que lidam necessariamente com os processos subjetivos dos sujeitos, o que imprime uma instabilidade aos possíveis conceitos. Portanto, acredito ser pertinente que pensemos o assunto em consonância com as discussões filosóficas que, por natureza das mesmas, são tentativas de nomear os fenômenos, de lidar com o inexprimível no âmbito da linguagem. É claro que estabelecemos assim uma instância de atrito, pois segundo Walter Benjamin em sua teoria da linguagem, para falar de arte não podemos lançar mão de uma fala identificada com a dos técnicos, mas nesse contexto “linguagem significa o princípio orientado para a comunicação de conteúdos intelectuais” (BENJAMIN: 1992, 177).

Uma das possibilidades para o exercício de pensar as práticas de treinamento atoriais como a própria substância teórica pode surgir a partir de uma certa noção de corpo no teatro contemporâneo. Hans-Thies Lehmann em seu livro Teatro pós-dramático nos diz que o movimento centrífugo e centrípeto da linguagem teatral remete sempre ao corpo e teria tido seu início quando um dos indivíduos se destacou das coreografias coletivas. Esse autor vai adiante e pensa que o corpo no teatro da contemporaneidade – que denomina de Pós-dramático – fascina menos pelo o que ele simboliza do que pelo modo imediato de sua “presença”. Recusa-se assim para o corpo o papel de significante para dar lugar a uma “corporeidade auto-suficiente, que é exposta em suas intensidades, em seus potenciais gestuais” (LEHMAN: 2007, 157). O que ocorre é uma irradiação da materialidade corporal e de sua presença ali diante dos espectadores, menos como personagem e mais como ser humano, o que proporciona um potencial de significabilidade que é “irremediavelmente enigmático”. O que Lehmann parece nos dizer é que o corpo como matéria promove uma experiência múltipla de sentidos por meio do que ele é, do que ele tem de ser, ou do ser que é.

Ainda neste sentido Lehmann fala de uma espécie de qualidade ambígua do corpo no teatro de dar a ver sua própria porção de morte. A presença viva, carnal do corpo, associada com a noção de hybris que permeia as origens das manifestações teatrais, configuram ambas, um estado de perigo permanente para este corpo que estaria sempre na iminência de ser transformado, de revelar outra condição, de arriscar por meio de seus gestos a sua própria visibilidade para dar lugar à outra imagem que de certo modo deve se insurgir contra a primeira. Gostaria de pensar essa afirmação em consonância com o que nos diz Patrice Pavis de que o ator de teatro tem um duplo status, ou seja, se dá a ver como uma presença carnal e ao mesmo tempo remete sempre para uma outra cena que extrapola o visível (PAVIS: 2003, 53) (1). Podemos levar em conta que qualquer noção que permeie a construção de estruturas de treinamento para atores tem em sua forma esse horizonte duplo. Horizonte esse que parece descortinar um corpo que aponta paradoxalmente para um devir de sua própria inexistência, ou em outras palavras, um corpo que sinaliza seu potencial de morte. Se a idéia de treinamento ao extrapolar o lugar mais comum de corpo treinado e dar lugar, ao que parece ser de direito, que seria a evidência do corpo, podemos pensar que esse corpo em sua visibilidade aponta para o que todos os corpos têm em comum: sua condição de matável. Dessa perspectiva, o corpo no teatro pós-dramático de que nos fala Lehmann pode exibir sua condição de cadáver.

Partindo dessa perspectiva bifurcada, da condição de vivente que o corpo treinado (biológico) dá a ver e por isso mesmo exposto à morte, esse corpo constitui uma noção de imagem que inclui um não presencial. Uma imagem contraposta de certo modo à noção renascentista de indivíduo retratado, dando lugar a uma imagem/criatura. Esse pensamento pode ser compreendido em semelhança à noção de “Vida Nua” desenvolvida pelo filósofo italiano Giorgio Agamben. O conceito de “Vida Nua” traz à luz o vínculo oculto que, segundo esse autor, desde sempre ligou a vida nua, a vida natural não politizada, ao poder soberano. Esse poder soberano podia decidir quem iria morrer e quem ele deixaria viver. Portanto, o que estava em jogo não era garantir a vida dos indivíduos, o olhar não se detinha em detectar melhores modos de vida, mas de fazer morrer os que, pela perspectiva do rei, não viviam de acordo com as normas ou ameaçavam a vida do soberano ou dos súditos. A vida era consequência de não ter que morrer. Agamben parte ainda de uma obscura figura do direito romano arcaico que será a chave que permitirá uma releitura crítica de toda nossa tradição política: o Homo Sacer, ou seja, um ser humano que podia ser morto por qualquer um, impunemente, mas que não devia ser sacrificado segundo as normas prescritas pelo rito. Portanto, o Homo Sacer é aquele cuja “vida nua”, isto é, sua vida biológica (zoé), tornou-se eliminável, desqualificando qualquer possibilidade de um direito legal de sua vida política (bios).

Procurarei nesse breve artigo, respeitando seu limite formal, estabelecer algumas discussões que possam se configurar como um possível percurso de conhecimento para pensar pontos de interlocução entre a estrutura do treinamento para atores que descende do Teatro Laboratório de Jerzy Grotowski (2) e a noção de Vida Nua de Agamben.

Pensamento material – imanência

É importante ressaltar que existe um perigo sempre iminente quando procuramos elaborar uma teoria. O perigo está em chegarmos a conceitos vazios ou carregados de abstrações impossíveis de serem aderidas às práticas, justamente por não nascerem das mesmas. A meu ver, o olhar investigativo deve procurar por devires que constituem a própria matéria em questão, tendo em vista que existe sempre um campo de ação e pensamento que está para além dos objetos e que, portanto, nos impõe pelo próprio objeto, uma necessidade filosófica como a que Arthur C. Danto nos fala a respeito dos desdobramentos das performances do grupo Fluxus no final da década de 50 e início dos anos 60. Esse autor, no texto O mundo como armazém: Fluxus e Filosofia, se refere a uma espécie de revolução conceitual promovida pelas performances Fluxus com os objetos e sons cotidianos inseridos em uma situação de arte, que revelava os objetos do mundo material, da instância do real, como “agentes duplos ontológicos – que eram simultaneamente pedaços de arte e meras coisas reais”. Daí começa a surgir um pensamento sobre a possibilidade de fazermos um uso comum da habilidade com a qual reconhecemos uma obra de arte e o nosso modo de percepção do dia a dia, que geralmente se pode considerar um lugar no qual fazemos uso de nossos sentidos ordinários.

Do mesmo modo, uma prática de treinamento físico para atores pode suscitar desdobramentos filosóficos se conseguirmos o esforço de desenvolver um pensamento imanente. A professora Tatiana Motta Lima ressalta em sua tese de doutorado que o mestre de teatro Jerzy Grotowski, em textos e declarações a partir dos anos de 1970, chama a atenção para os perigos de qualquer canonização de terminologias – e podemos ler aqui conceitos – que não sejam fundados nas transformações advindas das experiências práticas. Pode-se dizer, de modo bastante sucinto, que a professora defende que as transformações terminológicas efetuadas por Grotowski ao longo de seu trabalho dão a ver sua característica fundamental de pesquisador, ou seja, alguém que configurou seu trabalho na tensão entre a prática e a teoria. Se por um lado, para Grotowski “só a prática, só o ato conta”, por outro lado, “atribuía às palavras uma enorme importância” e como conclui Ludwik Flaszen (3): “O Grotowski prático era um homem em perene perseguição das palavras”, ele “mudava as modalidades do trabalho e procurava as palavras que denominassem o mais fielmente possível a fluida tangibilidade da Experiência” (FLASZEN apud LIMA: 2008, 46).

Identifico ainda o esforço teórico de pensar uma prática de treinamento para atores como uma forma de resistência nos termos em que a desenvolve Jacques Rancière. Uma das perspectivas do autor fala da relação que se configurou no senso comum entre as noções de arte e de resistência a partir da homonímia da palavra resistência. Essa palavra contém tanto a idéia de transformação (ativa) de um estado atual das coisas, quanto a imobilidade (passiva) da pedra. O que quero dizer é que a noção de treinamento nos faz pensar a imanência do corpo (assim como a da pedra), evitando um significado transcendental representacional, o que de certo modo, desfocaliza o pensamento da experiência pessoal do ator, nos fazendo entrar em um campo mais incerto em relação às teorias mais tradicionais sobre o ator imbricadas, por exemplo, nas noções de personagem. O domínio por meio do entendimento, portanto, se desloca para a matéria se experimentando a si mesma em um movimento de desterritorialização em relação a um campo mais conhecido. Trata-se de pensar com Rancière para além das formas constitutivas do regime representativo da arte que pressupõe uma visão hierárquica do mundo, ou seja, não pensarmos o sensível como algo extirpado ao sensível.

Neste sentido, é que a forma de resistência de minha formulação teórica parte da investigação das possíveis formas de resistência ao pensamento mais tradicional em relação ao ator de teatro, que compõem a estrutura do treinamento descendente do treinamento elaborado por Grotowski na época de seu Teatro Laboratório e que foram exaustivamente experimentadas por mim ao longo do meu trabalho como atriz. Portanto, o próximo passo é nos voltarmos para o objeto e procurarmos alguns pontos onde possamos identificar um pensamento material, ou seja, uma instância na concretude corporal que resiste à ideia de pura representação mental, mas que por sua presença, sua imanência, remete a outras formas no aqui e agora.

O Treinamento – uma colagem

O treinamento do ator (4) elaborado por Jerzy Grotowski resultou de um trabalho de pesquisa desenvolvido durante os anos de 1959-62, à época do Teatr Laboratorium. Grotowski procurava por um trabalho pré-criativo da composição atorial, que pudesse agregar as faculdades imaginativas e as potencialidades do físico (5). Suas investigações partiram, de certo modo, do trabalho sobre as Ações Físicas (6) de Constantin Stanislavski. Como ele mesmo reconheceu em uma conferência proferida, em 1980, na Brooklyn Academy de Nova York, um dos sentidos de sua pesquisa correspondia justamente em ir adiante a respeito das descobertas do mestre russo a respeito da relação entre a memória emotiva e o trabalho do ator. Podemos compreender que o trabalho do ator, mais especificamente sobre uma certa noção de corporeidade, é elemento fundamental para o desenvolvimento do que o mestre polonês denominava o ato teatral, ou seja, não um teatro da palavra, nem qualquer espécie de espetáculo de qualidades físicas, mas uma cena em que a existência viva pudesse ser revelada (7). Grotowski elaborou um treino físico composto por estruturas corporais fixas mas que também contém espaços para a improvisação. A idéia é que o ator possa construir um treino que conforme a relação entre a técnica criativa, sua imaginação e associações pessoais, resultante das tensões entre o que é individual do ator e a materialidade de seu contexto sócio histórico. Deste modo, é fundamental o trabalho sobre as conexões com o outro, os objetos, as superfícies, o espaço e a temporalidade. Nesta experimentação de Grotowski, o propósito é a diminuição do lapso existente entre o que o ator pensa e o que pode realizar, possibilitando que o corpo seja, o mais próximo possível, uma matéria psíquica.

As estruturas físicas desse treinamento se assemelham às técnicas de colagem e montagem que de certo modo remetem às formas oníricas. É certo que existe um fluxo, porém, o ator precisa trabalhar todo o tempo sobre a mudança de direção no espaço e de tempo ritmo. Essa colagem acaba não permitindo que o ator se apegue aos riscos de uma subjetividade psicologizante e cria uma zona de interferência intermitente que problematiza a relação entre o que é o real e o que é o ficcional, assim como os elementos colados de Picasso e Braque. Nessa relação, tais elementos colados quando aplicados criavam um problema para a representação pictórica e revelava sua natureza forjada na relação tensa entre o que é o real e o ficcional. Podemos dizer que se tratava, no caso do fragmento colado, de uma realidade “falsificada”, ou seja, um pedaço de oleado imitando a palha de uma cadeira não pode ser considerado mais real do que a pintura da palha da cadeira. Clement Greenberg fala de uma tensão que seria a da diferenciação dos planos na pintura, para que pudesse superar, de certo modo, sua planaridade física, permitindo uma ilusão, por menor que fosse, de uma tridimensionalidade. Deveria haver, segundo Picasso e Braque, uma diferença entre planaridade física literal e a planaridade pictórica, o que eles buscavam com o uso desses recursos, como o da colagem.

O que parece ainda mais transformador em relação ao olhar não é tanto que a apreensão do objeto pictórico dependa do ponto de vista do observador, mas principalmente, de uma relação entre duas realidades: a pictórica e a empírica. O objeto da realidade empírica não aparece na superfície do quadro do modo que o vemos no cotidiano, mas mesmo assim nós o vemos. No cubismo, uma guitarra, um jarro, ou um cesto de frutas, por exemplo, aparecem transformados pelo esfacelamento dos planos, mas podemos reconhecer cada um dos objetos. Esta perspectiva nos permite pensar na colagem cubista como uma nova “direção” na arte, onde coisas em conflito produzem um novo estatuto do ver. A relação conflitual e tensa entre as partes que compõem o espaço pictórico quebram a homogeneidade da representação do mundo pensado como um todo, e produzem o feito do choque

“Se um pedaço de jornal pode se tornar uma garrafa, isso nos dá algo que pensar também em relação a jornais e garrafas ao mesmo tempo. Esse objeto deslocado penetra num universo para o qual não foi feito e no qual retém, em certa medida, a sua estranheza. E essa estranheza foi o que nós quisemos fazer as pessoas pensarem porque estávamos totalmente conscientes de que nosso mundo estava se tornando muito estranho e não propriamente tranqüilizador.” (Pablo Picasso. Apud PERLOFF: 1999, 96)

Investigando a origem do termo collage, Marjorie Perloff diz que este vem do verbo francês coller e “significa literalmente ‘afixar’, ‘pregar’, ‘colar’”. Literalmente, a colagem já era praticada em trabalhos de arte há muitos séculos, porém, não com um resultado final semelhante às estruturas de justaposição do cubismo, cuja distinção fundamental é o “fato de que sempre implica a transferência de materiais de um contexto para outro, ainda que o contexto original não possa ser apagado” (PERLOFF: 1999, 102). Neste sentido, Perloff diz que o elemento colado produz uma dupla leitura, pois

“cada elemento citado quebra a continuidade ou a linearidade do discurso e conduz necessariamente a uma dupla leitura: a do fragmento percebido em relação ao seu texto de origem, e a do mesmo fragmento como incorporado em um novo conjunto, uma totalidade diferente. O estratagema da colagem consiste também em nunca suprimir inteiramente a alteridade desses elementos reunidos em uma composição temporária.” (Grupo Um, Eds., Collages, revue d’esthétique, n.3-4.Paris: Union Genérale d’Editions, 1978: 34,35. In PERLOFF: 1999, 103).

Essa dupla leitura do elemento colado quando relacionada materialmente com os procedimentos de colagem do treino nos permitem dizer que está em exercício o próprio lugar do paradoxo vida/morte, sujeito/objeto. Outro ponto importante é que o processo de subjetivação que é o training inclui um elemento de dessubjetivação – ao tentar fazer-se sujeito torna-se em alguma medida objeto. O corpo biológico torna-se objeto como mero corpo criatura, porém, o procedimento material da colagem estabelece uma zona de desconforto em relação ao “mero” corpo (zoé). E é possível dizer que existem momentos de indeterminação quanto ao estado puramente biológico que suscita o treinamento em questão, momentos constituídos por paradoxos.

Notas:

(1) Segue uma citação do livro de Pavis a respeito desse duplo status do ator de teatro que considero importante para a compreensão da discussão que desenvolvo mais adiante: “O primeiro “trabalho” do ator (…) é o de estar presente, de se situar aqui e agora para o público, como um ser transmitido ao vivo, sem intermediário. (…) É uma marca do ator de teatro que eu o perceba “de cara” como materialidade presente, como “objeto” real (…) e que depois eu o imagine em um universo ficcional” (PAVIS: 2003, 53). O sublinhado é meu e chama a atenção para o que discutirei em relação a uma presença que porte ao mesmo tempo essa duplicidade, ou seja, que dá a ver o paradoxo.

(2) A concepção de fenômeno teatral de Grotowski passou por transformações importantes e , portanto, por diferentes fases que procuravam uma nomenclatura mais ajustada ao contexto. Sua carreira iniciou pela denominada “arte como representação ou Teatro de produção”. Este período compreendeu os anos de 1957-69 e o grupo Teatr laboratorium com encenações como Dr Fausto de Marlowe, Akropolis de Wipiaski, Príncipe Constante de Calderón de La Barca e Apocalypsis cum figuris, sobre textos bíblicos e de Dostoievski. Após esta fase, Grotowski dedica-se à pesquisas que ele denomina de “Parateatro”. Esse trabalho realizou-se no período de 1969-78. Em seguida até o ano de 1982, dedica-se ao chamado “Teatro das Fontes”, a partir do qual já se delineiam algumas questões referentes aos seus últimos trabalhos como o “Drama Objetivo” e a “Arte como Veículo”. Neste último período, já não realiza exibições públicas e passa a trabalhar no Workcenter na Itália, com grupos ligados a representações de ritos sagrados provenientes de várias culturas.

(3) Ludwik Flaszen foi dramaturgista e colaborador de Grotowski ao longo de dez anos a partir da fundação do Teatro Laboratório em 1959 na cidade de Opole na Polônia. As citações de Flaszen e de Grotowski são do livro O teatro Laboratório de Jerzy Grotowski.

(4) Exemplo de uma estrutura do treinamento:

• Colocar-se no espaço, andar, andar se desenvolve paulatinamente para uma corrida;
• A corrida explode numa espécie de dança pessoal que não deve ter elementos de danças conhecidas e deve-se trabalhar com a coluna, com a bacia e saindo do chão o máximo possível;
• Entrar com a primeira postura e trabalhá-la em diferentes direções e tempo ritmo;
• Voltar à corrida e entrar com a segunda postura;
• Corrida com cambalhotas e saltos acrobáticos;
• A seqüência do treino deste ponto em diante é a de intercalar a corrida com as posturas trabalhadas;
• Rolamentos finais a partir da bacia, no plano baixo, com experimentação livre das posturas;
• Ir levando o trabalho para uma finalização.

(5) Nas palavras de Grotowski: “Eu procurava uma técnica positiva ou, em outras palavras, um determinado método de formação capaz de dar objetivamente ao ator uma técnica criativa que se enraizasse na sua imaginação em suas associações pessoais” (GROTOWSKI: 1972, 84).

(6) Constantin Stanislavski chegou à conclusão, em suas pesquisas, de que o ator deve parecer o mais possível com a vida real. Quando papel e ator estão conectados, o papel ganha vida – e o que se faz necessário é constituir uma técnica capaz de possibilitar que isto sempre ocorra. Para tanto, ensinava que o que deve existir é uma técnica que possibilite a sensação do real. Isso certamente depende de como o ator se aproxima do seu papel, do quanto “ama” o seu papel. Stanilslavski sistematizou procedimentos para o ator relacionados a uma certa concepção psicológica. Desde sua criação, seu sistema influenciou profundamente a arte teatral, e seu criador nunca abandonou a visão sobre o desempenho realístico junto ao amor pela arte. O Sistema consiste num método complexo para produzir a atuação realística. Usando o Sistema, uma ator é levado a proceder a uma profunda análise de si mesmo, bem como ao conhecimento do seu personagem. O ator é levado a descobrir os objetivos do personagem a cada cena, dentro do objetivo-geral da peça inteira. Uma forma de se conseguir isto era o “segredo” de Stanislavski. Exigia que os atores fizessem inúmeras perguntas sobre seu personagem. Por exemplo, uma das primeiras perguntas que o ator deve fazer, antes de atuar, é: O que eu faria, se estivesse na mesma situação que o meu personagem?.

(7) Cito aqui um trecho da dissertação de mestrado de Henrique Gusmão, realizada sob a orientação do professor José da Costa na Unirio, no qual ele esclarece um aspecto importante da esfera corporal no trabalho das Ações Físicas de Stanislavski: “Stanislavski, ao se referir a este conceito (…) nomeava-o de ‘ação-psicofísica’. Neste sentido não seria somente um conjunto de movimentos físicos, mas um uso do corpo específico, de forma que todos os seus atos sejam repletos de qualidade” (GUSMÃO: 2006, 117).

Referências bibliográficas:

AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer. Trad: Henrique Burigo. Belo Horizonte: UFMG, 2007.

BENJAMIN, Walter. Sobre a linguagem em geral e sobre a teoria da linguagem humana: Relógio d’água, 1992.

GREENBERG, Clement. Estética doméstica – observações sobre a arte e o gosto. Tradução André Carone. São Paulo: Cosac Naify, 2002.

GUSMÃO, Henrique. Fronteiras do sujeito, fronteiras do corpo, fronteiras do teatro. Subjetividade e uso do corpo no trabalho do ator proposto por Constantin Stanislavski. Programa de Pós-Graduação em Teatro. Rio de Janeiro: UNIRIO, Dissertação de Mestrado, 2006.

GROTOWSKI, Jerzy. Em busca de um teatro pobre. Trad: Aldomar Conrado. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971.

LEHMANN, Hans-Thies. O teatro pós-dramático. Trad: Pedro Süssekind. São Paulo: CosacNaif, 2007.

Lima, Tatiana Motta. Les Mots Protiqués: relação entre terminologia e prática no percurso artístico de Jerzy Grotowski entre os anos 1959 e 1974. PPGAC,Unirio. Rio de Janeiro: 2008.

PAVIS, Patrice. A análise dos espetáculos. São Paulo: Perspectiva, 2003.

PERLOFF, Marjorie. A invenção da colagem In O momento futurista. São Paulo: Edusp, 1999.

RYNGAERT, Jean Pierre. Ler o teatro contemporâneo. Trad: Andréa S.M. da Silva. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Revistas especializadas:

Máscara. Org. e dir. Edgar Ceballos. Ano 3 N. 11-12. México: Escenologia, 1993.

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